Um dos factores que, logo à partida, desempenha um papel fundamental
na escolha e organização dos apoios é o grau
de
dependência
da
pessoa
idosa. A
diferentes graus de dependência correspondem diferentes
necessidades, diferentes tipos de cuidados, níveis variados de
exigência para os familiares e, por último, a mobilização de
recursos, também eles diferentes.
As famílias que têm a seu cargo um idoso com baixa dependência
podem sempre optar, na generalidade dos casos, por deixar este último
sozinho em casa durante o dia. Isto faz com que outros factores, tais como a disponibilidade de apoios
familiares e extra- familiares (informais e formais), entre outros,
não adquiram uma importância vital na estruturação dos cuidados.
Deixar a pessoa idosa com baixa dependência sozinha em casa, apesar
de não ser a solução ideal para algumas famílias, é uma
alternativa que acaba por se constituir como um recurso que facilita
a conciliação entre as responsabilidades profissionais e as
responsabilidades de prestação de cuidados.
É sobretudo junto das famílias que têm a seu cargo idosos
com média/elevada
dependência que
outros factores adquirem uma significativa importância na escolha e
na organização dos apoios. Entre esses factores destacamos as
preferências do idoso dependente e dos seus familiares em relação
aos vários tipos de apoios, o grau de flexibilidade dos horários de
trabalho dos familiares prestadores de cuidados, o grau de
disponibilidade de apoios informais e formais e, por último, o nível
de rendimento familiar.
Começando pelas preferências,
interessa sublinhar que a totalidade das famílias entrevistadas
prefere manter
o
idoso
em
meio
familiar,
preferência essa que pode implicar a intervenção de diferentes
tipos de apoios. O lar é perspectivado como o último recurso a ser
usado. Esta posição é, de acordo com os familiares entrevistados,
igualmente partilhada pelas próprias pessoas idosas dependentes.
Se em relação a este ponto as opiniões parecem convergir, já o
mesmo não se pode afirmar relativamente aos tipos de apoios que
permitem manter o idoso dependente em meio familiar. Em algumas
famílias a preferência da pessoa idosa dependente não corresponde
à preferência dos seus familiares. Nestes casos, como tivemos
ocasião de registar, tem prevalecido a vontade da primeira, mesmo
indo contra o seu próprio bem-estar. Isto quer dizer que a escolha e
organização dos apoios tem sido fortemente influenciada pela
preferência manifestada pela pessoa idosa dependente.
Relativamente ao grau de flexibilidade
dos horários de trabalho, vários familiares atribuíram
uma grande importância a este factor na conciliação entre as
responsabilidades profissionais e as responsabilidades de prestação
de cuidados. Mesmo nos casos em que existem horários atípicos
(trabalho por turnos, horários longos...), ter alguma
flexibilidade funciona sempre como um factor facilitador ao nível da conciliação.
Por exemplo, a possibilidade de um dos familiares poder flexibilizar
o horário de trabalho é um dos factores que determina, sozinho ou
em conjunto com outros, a escolha e a organização dos apoios. Por
exemplo, como tivemos ocasião de constatar, as famílias que
recorrem aos serviços de um Centro de Dia só muito dificilmente
conseguiriam continuar a usufruir deste apoio se um dos seus membros
não tivesse um horário de trabalho com alguma flexibilidade, visto
que os Centros abrem demasiado tarde e fecham cedo. Por sua vez, numa
das famílias onde existe apoio domiciliário a tempo inteiro a
possibilidade de a principal prestadora de cuidados poder entrar mais
tarde no seu local de trabalho permite-lhe esperar pela chegada da
ajudante contratada. Para além destes casos, existem outros que,
como tivemos ocasião de ver na descrição das soluções de
prestação de cuidados, ilustram a importância da flexibilidade do
horário de trabalho.
O grau de disponibilidade de
apoios informais é outro factor fundamental na
estruturação dos cuidados. A este respeito, existe um recurso que
sobressai ao longo da descrição das soluções de prestação de
cuidados: haver um familiar com disponibilidade para ficar com o
idoso dependente durante o dia. Este familiar (muitas das vezes o
cônjuge do idoso dependente) pode ter capacidade para prestar alguns
cuidados básicos ou apenas companhia e vigilância. Por conseguinte,
tal como verificámos anteriormente, pode ser o elemento-chave que
viabiliza uma solução exclusivamente familiar ou uma solução
mista com apoio domiciliário a meio tempo. Contudo, em qualquer dos
casos, evita que o idoso dependente fique sozinho em casa, situação
que não é a mais adequada do ponto de vista do bem-estar e da
segurança deste último. É, por isso, um recurso de extrema
importância.
Para além disto, a existência de outros membros disponíveis para
partilhar a prestação de cuidados adquire, de igual modo, especial
importância. A partilha de cuidados entre vários familiares é,
como vimos no ponto anterior, imprescindível para a manutenção da
solução familiar de cuidados básicos no domicílio. Mesmo nos
casos em que existem apoios extra- familiares (ex: Centro de Dia,
apoio domiciliário), a partilha de cuidados entre os membros do
grupo doméstico acaba sempre por funcionar como um factor
facilitador da conciliação entre o trabalho e os cuidados ao idoso,
pois evita que um deles fique com uma sobrecarga excessiva de
responsabilidades.
No caso de os apoios informais serem inexistentes ou insuficientes,
existe ainda a possibilidade de se recorrer a apoios formais.
O grau
de
disponibilidade
de
apoios
formais
(Centro de Dia, apoio domiciliário...) depende das taxas
de cobertura ao nível de instituições e de serviços para idosos.
Em primeiro lugar é necessário que estes apoios existam a nível
local, mas em segundo lugar é também necessário que sejam acessíveis em
termos geográficos e que ofereçam serviços adequados às
necessidades das famílias (quer em termos da diversidade das
respostas, quer em termos da flexibilização dos horários de
funcionamento). Para além disso, existe ainda a questão da
acessibilidade aos serviços em termos financeiros, acessibilidade
essa que é determinada, por um lado, pela estrutura da própria
oferta, ou seja, pela forma como esta está distribuída pelos
diferentes sectores intervenientes (sector público, sector privado
não lucrativo, sector privado lucrativo, sector informal pago) e,
por outro lado, pelo nível do rendimento familiar.
O nível
do
rendimento
familiar
é, assim, outro factor que influencia a escolha e a
organização dos apoios, na medida em que pode ou não permitir o
acesso a serviços pagos. Como vimos, as famílias que usufruem de
serviços informais de apoio domiciliário a tempo inteiro têm um
nível de rendimento per capita elevado. Vimos também que outras
desejariam ter acesso a este tipo de serviços, mas tal não lhes é
possível devido a restrições de natureza financeira.
REALIDADE: As soluções de Estruturação dos Cuidados
1. Solução
familiar de cuidados básicos no
domicílio
As famílias que adoptam esta solução têm em comum o facto de
terem a seu cargo uma pessoa idosa com elevada
dependência.
Daí a necessidade de prestação de cuidados básicos diários, os
quais são assegurados por membros do agregado familiar (a pessoa
idosa reside com estes últimos). Os familiares asseguram a prestação
de cuidados numa base permanente, inclusive aos fins de semana, nas
férias e em situações ocasionais.
Em alguns casos os cuidados
são partilhados
por dois ou mais familiares do idoso dependente e, noutros
casos, são assegurados apenas
por
um
familiar.
2. Solução familiar de supervisão
A supervisão pode, de igual modo, ser partilhada entre vários
familiares ou desempenhada apenas por um deles. Contudo, como a
supervisão é uma actividade que, por um lado, não exige
normalmente um grande dispêndio de tempo e energia e, por outro
lado, pode ser efectuada à distância (por exemplo, através do
telefone)16
é, comparativamente com os cuidados básicos, mais
facilmente prestada por apenas uma pessoa.
A partilha deste tipo de cuidado pode efectuar-se em regime de
rotatividade. A supervisão
rotativa
acontece quando vários irmãos acolhem, de uma forma
alternada ao longo do ano, um ou ambos os pais nas suas próprias
casas.
Este tipo de solução proporciona a todos os filhos uma maior
facilidade na conciliação entre as responsabilidades profissionais
e as responsabilidades de prestação de cuidados. Mesmo que estes se
vissem obrigados a fazer algum reajustamento nos seus horários de
trabalho, tal só seria necessário de três em três meses.
Quando a pessoa idosa tem um grau baixo de dependência existe a possibilidade de se recorrer a outras soluções, tais
como ter o apoio de um Centro de Dia ou de um Centro de Convívio,
onde a pessoa idosa pode ficar durante o período de tempo em que os
seus familiares estão a trabalhar.
3. Solução mista de cuidados básicos no domicílio
3. Solução mista de cuidados básicos no domicílio
Nesta
solução os cuidados
básicos no domicílio são
prestados pela família
em
conjugação
com apoios
extra-familiares pagos (ajudante
familiar não certificada, serviço
de apoio domiciliário de uma empresa particular ou de uma IPSS...). Estes últimos operam apenas em determinados momentos ou horas do dia sendo a família que assegura a prestação de todos os cuidados necessários.
Todas as famílias que representam esta solução de prestação de
cuidados têm em comum o facto de terem a seu cargo uma pessoa idosa
com um grau
elevado
de
dependência.
Isto faz com que a hipótese de recurso a um Centro de Dia seja pouco
viável, visto que este tipo de equipamento só está vocacionado para receber pessoas que tenham,
no máximo, um grau médio de dependência.
Podemos considerar duas formas diferentes de combinação
do apoio familiar com o apoio extra-familiar: uma que combina apoio
familiar com apoio
domiciliário
em
regime
parcial/meio
tempo
(até de 2/3 horas por dia), prestado numa base formal, e
outra que combina apoio familiar com apoio
domiciliário
em
regime
de
tempo
inteiro (8 horas por dia), prestado numa base informal
4. Solução mista de supervisão
4. Solução mista de supervisão
Nesta solução a supervisão
é prestada por um
familiar
do idoso dependente e por uma pessoa
fora
da
família
que, nos casos aqui considerados, é uma empregada
doméstica muitas vezes sem formação adequada para cuidar. Para além de prestar serviços de limpeza, de tratamento de roupa e
de preparação e/ou confecção de refeições, a empregada
doméstica supervisiona as actividades desempenhadas pela pessoa
idosa (viúva), que se encontra numa situação de baixa
dependência.
Normalmente a empregada doméstica já prestava serviços para
os familiares da pessoa idosa, mesmo antes desta última se ter
tornado dependente. Não foi, por isso, contratada com o propósito
de prestar cuidados a uma pessoa idosa
5. Solução mista apoiada na gestão familiar
Nesta solução, ao contrário dos restantes, os familiares do idoso
dependente não lhe prestam, pelo menos de uma forma regular,
cuidados directos (básicos ou de supervisão). Isso só acontece em
situações ocasionais. Os familiares desempenham um papel que se
situa, essencialmente, ao nível da gestão e da organização dos
cuidados que são prestados ao idoso por terceiros.
fonte:
JOSÉ
SÃO
JOSÉ*
KARIN
WALL*
SÓNIA
V.
CORREIA* 2002
"TRABALHAR E CUIDAR DE UM IDOSO DEPENDENTE: PROBLEMAS E SOLUÇÕES"
Instituto de Ciências Sociais - Universidade de Lisboa
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nivel de dependência