fonte: LUSA
Há “uma dupla almofada no efeito da crise” - avós ajudam monetariamente, mulheres assumem mais as rédeas da casa e substituem-se à empregada doméstica -, diz estudo da Universidade de Coimbra. Mas este modelo é “inviável e insustentável”, uma vez que “a geração atualmente ativa não terá condições para fazer o mesmo aos seus filhos”
Segundo os resultados do inquérito do projeto de investigação, já divulgados pela Lusa em outubro de 2014, 37,4% das famílias sofreram reduções de salários, mais de um quinto considera ter perdido segurança no emprego, 30% endividaram-se mais (metade dos quais junto das famílias), 67% têm um orçamento familiar mais reduzido, quase 30% procuram mais ajuda para resolver problemas emocionais ou de ansiedade e 65% deixaram de sair ou de fazer programas de diversão ou lazer.
Os avós ajudam “nas dimensões mais variadas da vida familiar”, como na aquisição de casa, carro, pagamento de empréstimos ou com bens alimentares. As mulheres, face aos cortes em despesas como empregada doméstica, creche ou lar, assumem mais trabalho familiar não remunerado, apontou Lina Coelho, salientando que há “uma dupla almofada no efeito da crise”.
Segundo a investigadora, a lógica de solidariedade intergeracional ajuda a perceber porque é que o impacto da crise em Portugal “não foi sentido de forma tão angustiante e com expressões de revolta”. No entanto, este modelo social, assente numa rede de solidariedade que substitui aquilo que é um papel ocupado pelo Estado Social “nos países mais ricos”, é “inviável e insustentável”, alerta.
“A geração atualmente ativa não terá condições para fazer o mesmo aos seus filhos. Quando as pessoas hoje com 40 anos terão 70, terão possibilidade de apoiar os filhos? Não creio”, frisou a investigadora. “Estas famílias fizeram esforços de ajustamento muito pronunciados, esgotaram as suas poupanças, algumas endividaram-se mais e mesmo aquelas que não caíram em situações de desemprego têm hoje uma robustez económica debilitada”, frisou.
A incerteza na vida dos casais com filhos e a inexistência de margens “para acomodar surpresas que surjam” fica vincada num funcionário público não qualificado, entrevistado no âmbito do projeto, que remete para a falta de esperança. “O impacto da crise é mesmo a falta de uma pessoa sonhar. Não se pode fazer nada. Não se pode sonhar, não se pode pensar em ter, não se pode. Zero”, refere o funcionário, num excerto da entrevista disponibilizado à agência Lusa.
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