Há explicação para nos casais de idosos um morrer logo a seguir ao outro?
Em dezembro de 1947, a recém-casada Violet, norte-americana de Fresno, na Califórnia, escreveu ao marido Floyd Hartwig, que servia na Marinha norte-americana: “Preciso dos teus braços em volta de mim. Todo o meu amor é teu. Cuida-te. Espero estar contigo em breve. Amo-te, amo-te e vou amar-te enquanto eu viver. Da mulher que te ama, sempre. Violet.” Floyd e Violet ficaram casados por 67 anos. Em fevereiro de 2015, os dois morreram no mesmo dia, lado a lado, com cinco horas de intervalo.
São várias as notícias e relatos nos média sobre casais que morreram com um intervalo de tempo muito curto entre um e outro. E, inevitavelmente, somos atraídos por essas histórias que nos soam a histórias de amor, bem vividas e deveras comoventes. Provavelmente, porque sugerem que o amor realmente dura para sempre, mesmo além da morte. Mas será que há mesmo alguma coisa subjacente, ou é apenas coincidência?
Apesar de ser um tema que absorve a atenção, são ainda poucas as evidências científicas que garantam esta relação de causa-efeito.
As pessoas nesta faixa etária estão diretamente confrontadas com a morte e a perda do(a) companheiro(a). Esta é uma das experiências mais traumáticas e de maior sofrimento que o ser humano pode enfrentar, e a adaptação à vida sem o ente querido é uma tarefa, muitas vezes, difícil e complexa para o que fica. A morte de um marido ou mulher é bem reconhecida como um momento emocionalmente devastador, sendo classificada, em escalas de episódios de vida, como a mais stressante de todas as perdas possíveis.
A morte de um companheiro tem, geralmente, uma representação do vazio, como se uma parte de si deixasse de existir, apenas para permanecer na memória e no coração dos que com ele compartilharam a vida.
Quanto mais longo o percurso, mais momentos há a lembrar, maior é a cumplicidade e o compromisso nos objetivos, nas conquistas e nas derrotas que, após um relacionamento de muitos anos, com tarefas e rituais próprios, se desfazem com a morte do companheiro. Casais frágeis ou doentes podem ter conseguido manter a sua independência juntos, compensando um ao outro. Uma esposa com mobilidade reduzida contava com o marido para a ajudar a subir ou a descer as escadas, a carregar o saco das compras.
Ela, por sua vez, cobria a perda de memória do marido, lembrando-o das tomas de medicação e até daquele programa que ele gostava de ver na televisão.
A longevidade num relacionamento é tida como uma evidência de comprometimento mas também que ambos os parceiros estão mais velhos. O corpo envelhecido é mais frágil do que o de um jovem, logo o choque de perder o companheiro de uma vida pode ser mais do que aquilo que se possa suportar.
Num estudo publicado pelo Journal of Public Health, com base em respostas de 12 316 participantes, concluiu-se que pessoas cujos cônjuges morreram têm uma maior probabilidade (66%) de morrer nos três primeiros meses após a morte do cônjuge.
O luto profundo é caracterizado por uma dor aguda, com a qual não somos necessariamente bons a lidar.
A perda pode ser acompanhada de mudanças comportamentais e fisiológicas que podem afetar o sujeito em toda a sua dimensão da saúde.
O luto pode ter um efeito devastador sobre o sistema imunológico. Em parte, isto pode explicar porque muitos idosos vivenciam um grave declínio na saúde, ou até mesmo morrem, logo após a perda do cônjuge.
A morte de um companheiro é tida como um momento de stresse severo, e alguns investigadores sugerem que os níveis de adrenalina e de cortisol desencadeiam um aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca, levando a um desmoronamento do corpo, causando uma insuficiência cardíaca, designada por “síndrome do coração partido”. A dor emocional dói tanto que é possível que a pessoa desenvolva uma cardiopatia verdadeira. Os sentimentos de angústia, aflição, agonia ou amargura podem causar mudanças a nível fisiológico que poderão ser fatais para a saúde.
Um estudo concluiu que pessoas cujos cônjuges morreram têm uma maior probabilidade de morrer nos três primeiros meses seguintes
Foram muitos os anos, as experiências, construídas e vividas, com a pessoa que morreu. Ela tinha uma infinidade de papéis: era companheira, cúmplice de lazer ou viagens, pai dos seus filhos, fonte de apoio e, às vezes, de inspiração. Perder o outro, porque ele morre, equivale a ser definitivamente separado dele, e viver assim já não faz sentido.
Contudo, pessoas há que sobrevivem após a morte de um companheiro de longa data. Isto não significa que não tivessem um casamento forte e amoroso. Provavelmente significa que quem ficou poderia estar em melhores condições de saúde do que aqueles que se foram, podem ter uma vontade mais forte de viver com e para os filhos ou simplesmente para si mesmos.
Estas mortes de histórias de amor tocam-nos o coração pelo romance implícito na mesma. Fazem-nos lembrar do sonho de que o amor verdadeiro pode durar uma vida inteira… e mesmo além da morte. Se eles vieram para a vida para estarem juntos, então quando um morre, o outro pode morrer também.
A vida tem um propósito que nunca poderemos entender, e quando esse propósito for cumprido, a morte vem.